Este texto foi escrito pelo Prof. Dr. Gilberto Scarton e resolvi transcrevê-lo aqui, pois mais uma vez tive que ouvir o comentário preconceituoso de um leigo na área. Linguística não é blábláblá, blábláblá é reality show (com Bs) e horário político.
Como já ouvi outros dizerem, não exatamente com as mesmas palavras, Linguística é a ciência mais f#@! da história, só por que todos falam, acreditam que tem base científica para fazer certas alegações sobre a linguagem, em sua maioria preconceituosas e equivocadas.
- Não dirás que cruzar com gato preto dá azar na certa, pois eles não são bruxos travestidas de inocentes animais. Nem aconselharás a alguém a fazer pedidos à vista de estrela cadente: só exclame um "oh!" de espanto, de admiração...
- Não dirás que espatifar um espelho ou (ad)mirar-se em espelho quebrado, à moda de Narciso, é pior do que passar por debaixo de escada: são sete anos de má sorte... Isso é bobagem!
- Não dirás que não sabes português, pois alguém poderá considerá-lo um idiota, que declara que não sabe uma língua falando aquela língua. Absurdo, né?
- Não dirás que a língua portuguesa é uma língua difícil, uma das difíceis, pois alguém poderá espantar-se acreditando que você só começou a falar aos dez anos, ao passo que um índio tupi-guarani, aos dois aninhos, já aprendeu, já sabe, já domina um monte de coisas de sua língua. (Poupa-te de dar vexame!!)
- Não dirás que a língua portuguesa está decadente... que está se corrompendo... que está sendo, aleijada, mutilada, conspurcada. Se assim fosse, poderia se dizer que a língua de Camões, de Machado, de Drummond é uma língua estropiada, fruto que é da evolução do latim falado por gente das camadas menos privilegiadas. As línguas simplesmente evoluem...
- Não dirás que uma língua ou modalidade linguística é melhor, mais rica, mais expressiva do que outra, pois todas elas são sistemas perfeitos de expressão, ferramentas que são para as pessoas se entenderem, se comunicarem.
- Não dirás, por isso, que o português da gente simples, da gente humilde é um português horroroso (ororozu), pois, ao te expressares assim, estarás expressando tua ignorância, ao desconheceres que uma língua é um instrumento de comunicação e não de discriminação. E que, se nós, os bonitos, falássemos daquele jeito, essa seria a "melhor" linguagem.
- Não dirás que as gramáticas são infalíveis. Nem dirá isso dos dicionários. Dirás, antes, que os utentes de uma língua ou modalidade é são infalíveis, uma vez que são condôminos, senhores absolutos da língua, cabendo aos gramáticos e dicionaristas apenas o seu registro. (Não queira, portanto, colocar o carro na frente dos bois, pensando que vem antes o dicionário e a gramática e depois os usos, a língua viva).
- Não dirás que em linguagem vale tudo, que não existe o certo e o errado. Dirás, antes, que em linguagem vale tudo o que tiver aceitabilidade contextualizada, o que estiver de acordo com o contexto, o que se adequar ao ouvinte, ao assunto, ao propósito do ato comunicativo, ao lugar em que ocorre a comunicação.
- Não dirás que o estudo intencional da gramática é (muito) importante para se escreverem bons textos, pois, se assim fosse, Camões não teria escrito "Os Lusíadas" naquela época (em que não existiam gramáticas).
- Não...
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