Apesar de ser a imagem masculina a que se sobressai quando se fala ou pensa em romance policial, não é possível ignorar o papel da mulher nessas histórias. Em verdade elas são normalmente o mote, ou a femme em perigo, ou a bandida sedutora que porá o bom detetive em encrenca — se bem que em romance noir, a palavra ‘bom’ seja muito discutível —ou a detetive.
Na série Millenium, do escritor sueco Stieg Larsson (1954-2004) se tem dois protagonistas, embora um se sobressaia mais. E não é o repórter sedutor, Mikael Blomkvist, e sim, a magricela baixinha e boa de briga, Lisbeth Salander — ou a menina da tatuagem de dragão. Apesar desta série ter sido chamada de noir por um inadvertido comentarista, falta aos personagens vícios que os coloque em par com Bleichert de Dália Negra. Falta, mas Lisbeth chega perto.
No primeiro livro da série Os Homens que não amavam mulheres, Mikael Blomkvist, depois ser condenado por difamação e ser desmoralizado pela mídia, é contratado por um empresário para escrever sua biografia e investigar a morte de sua sobrinha. Astutamente, esse empresário solicita a uma empresa de segurança que investigue Blomkvist antes de entrar em contato com ele. Entra em cena uma jovem de magreza anoréxica e aparência punk, Lisbeth Salander, como normalmente acontece, ela é julgada pela sua aparência e comportamento antissocial, porém se revela uma hacker de talento, dotada de memória fotográfica e QI de gênio. Será esta jovem quem ajudará e salvará Blomkvist nessa investigação. No segundo livro da série, Lisbeth é acusada de triplo homicídio e, diferente do que ela mesma esperava, Blomkvist e outros bons amigos iniciam uma corrida para provar sua inocência. No último livro, enquanto Lisbeth se recupera dos ferimentos que sofreu, uma nova jornada é iniciada para que os homens que a prejudicaram desde a infância sejam responsabilizados e punidos. O único problema é que esses homens são integrantes da polícia de inteligência do governo.
Durante os três livros Lisbeth deixa claro sua inabalável conduta moral que nem sempre está de acordo com os padrões da sociedade, o que lhe causa alguns problemas. O ponto causador de maior empatia entre o leitor e a protagonista é ela ser julgada pela aparência e então categorizada. Como House diz: ninguém gosta de ser posto na categoria errada. Ela não é o padrão de conduta e aparência ditada por Hollywood e por isso mesmo se revela tão cativante. Será que Hollywood manterá todas suas características ou será que irá submeter à homogeneização no estilo tom pastel que usualmente adotam ao fazer adaptação para o cinema?
Lisbeth Salander não tem problemas com invadir a privacidade dos outros, roubar bilhões de ladrão, bater em homens covardes, ocultar informações da polícia e ser fiel aqueles que a ajudam e que a querem bem. Ela segue sua vida como acha que deve ser.
Para quem gosta de histórias policiais, Millenium com certeza é uma ótima escolha. Stieg Larsson nos guia com uma narrativa ágil e instigante, com personagens dotadas de personalidades marcantes e bem desenvolvidas, revelando seu talento.
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