O texto a seguir trabalha com um tipo específico de linguagem, levando-se em conta um sistema semiótico maior, objeto de estudos peirceanos. A musicalidade insere-se em situações comunicativas que podem ser base para um trabalho na área de Relações Públicas. Danilo Marinho traz algumas ideias sobre o tema.
Afinal de contas, o que é música e qual sua relação com Relações Públicas? Esse tema tem me tirado o sono nos últimos meses. Conversando com alguns amigos músicos, estudantes e profissionais de Relações Públicas, tenho percebido que a música está presente na maioria das situações que vivenciamos. Seja tomando banho (cantando no chuveiro), seja conversando com amigos nas praças ou na sala da aula, seja debatendo algum tema, seja ouvindo música enquanto lavamos os pratos, varremos a sala, ou limpamos nossos quartos.
Partindo do pressuposto de que música é qualquer elemento sonoro, então a voz humana já pode ser considerada música. Entretanto, o conceito de música é bastante abstrato e muito particular. Na condição de um fenômeno cultural, ela só funciona porque é, também, um fenômeno de comunicação. Desse modo, poderemos chegar a algumas discussões preliminares: a música contém comunicação?; a música faz uso da linguagem?
Segundo Peirce, toda e qualquer produção e expressão humana são questões semióticas. Assim, esse fenômeno, como tantos outros, só comunica porque se estrutura como linguagem. Todo fato cultural e toda prática social se constituem, fundamentalmente, como partes integrantes de um processo, e todo processo comunicativo faz uso de signos, significados e significantes. A música é mais um integrante desse processo, seja na condição de coadjuvante ou de protagonista. Ela, enquanto um tipo de linguagem, carrega consigo, através de suas modalidades, um grande potencial cognitivo.
A musicalidade é uma dessas modalidades que fazem parte do repertório em que se desenvolvem os processos de comunicação. É aí que reside o grande diferencial para os profissionais de Relações Públicas. Segundo Margarida Kunsck,
As relações sociais que ocorrem no processo de comunicação envolvem o emissor, receptor e seus efeitos recíprocos um no outro à medida que se comunicam. Quando um emissor é intimidado por seu receptor durante o processo de envio de uma mensagem, a própria mensagem e a interpretação dela serão afetadas”. (KUNSCH apud HALL. 1984, p.133)
Estes são os elementos básicos que também compõem a produção musical: emissor (compositor), mensagem (produto musical) e receptor (ouvinte). Nesse contexto, o profissional de relações públicas tem a possibilidade de, parafraseando o músico Leonardo Correa, manipular o som, a fim de comunicar.
Desde a Segunda Guerra, a música é utilizada como estratégia de comunicação, na época para fins não tão nobres. A música, enquanto, produto cultural representa uma evolução significativa, pois acompanhamos de perto a sua aplicação de caráter pedagógico nas escolas primárias em tratamentos terapêuticos como a musicoterapia. Segundo dados do IBGE, a música, enquanto manifestação cultural representa 38,7% e a atividade musical em todo o país representa 47,2%. Esses dados por si só justificam o uso da música nas estratégias de comunicação pelas organizações.
No ambiente organizacional, tratamos de públicos, de pessoas. Dessa forma, a complexidade existente dentro do ambiente organizacional pode se tornar um grande pano de fundo para se construir relacionamentos com base no respeito, confiança e responsabilidade social. Inclusive esses são valores intrínsecos à música e musicalidade. Gutierrez afirma:
“A comunicação no ambiente empresarial e dele com os públicos está alicerçada na compreensão daquilo que se pretende transmitir, na linguagem comum que estabelece o universo de debates e efetiva o diálogo...” (GUTIERREZ, 2003)
“Transmitir na linguagem” (sugerindo aí a música) o estabelecer efetivo do diálogo, pois a musicalidade permite a comunicação, ou interação entre dois sistemas ou organismos.
Relações Públicas é em sua essência a prática dos relacionamentos entre diversos grupos, nas diferentes esferas da sociedade: cultural, econômico, político, social, mercadológico. No entanto, fazer uso de meios, que vão além da simples aplicação de técnicas mecanicistas, pressupõe a adesão de uma perspectiva democrática, em que, efetivamente, todos possam participar.
Danilo Marinho é pernambucano, estudante de Relações Públicas e músico.
Interessante a interface música/relações públicas, nunca li trabalhos sobre essa temática. Interessante também o fato de que a semiótica peirceana, mesmo inserindo-se no campo mais abrangente da filosofia do conhecimento (do que da filosofia da comunicação), traz uma estrutura teórica que abrange a comunicação também pelo viés social, não apenas cognitivo.
ResponderExcluirConfesso que sou fã da semiótica e quando percebi que existe essa interface entre a música/RP/semiótica, tentei pesquisar mais sobre o tema até formular essa questão como a musicalidade sendo mediadora dos relacionametos. Que bom que gostou Stéphane. Existe muito mais coisas a serem descobertas dentro da filosofia da comunicação que a semiótica pode nos ajudar a descobrir...Esse viés social é apenas uma parte.
ResponderExcluirP.S. Aceito sugestão para nova postagem...rsrss
Beijo
Dann
A filosofia da comunicação é um campo realmente amplo e fascinante!. As interfaces são formuladas pelos pesquisadores, algumas são mais facilmente mapeadas que outras. A semiótica peirceana é muito interessante, adiantando conceitos a nós indispensáveis com a criação e avanço das TICs, por exemplo. O conceito extremamente geral de signo, abstraindo em certo sentido a noção de consciência (não se atendo apenas à noção de signo mental), é muito inovador se pensarmos no contexto do lógico americano...Foi um trabalho colossal, mas parece que pouco aproveitado ainda. Tu podes explorar o próprio conceito de musicalidade. Podes trabalhar com a operacionalidade dos signos musicais dentro de um discurso de RP (tens que ver por qual perspectiva!). Há um céu de possibilidades, o instigante é mapeá-las! São apenas ideias..
ResponderExcluirQue tal se tomássemos um café para discutir essas ideias?? Assim, quem sabe podemos dar início as discussões sobre linguagem e afins...Pedindo permissão para te plagiar: "São apenas ideias..."
ResponderExcluirBeijo
Dann
Café é sempre bom! Quanto ao plágio, a lei dos direitos autorais está super rigorosa!
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