Perdão aos nossos leitores pela traição. Prometemos posts semanais, mas não estamos cumprindo. Aos poucos entraremos nos trilhos.
Aprender uma nova língua não é fácil (me perdoem a afirmação mais que do batida). A língua é parte da cultura a que pertence, refletindo-a e sendo refletida nela. Um processo natural, sobre o qual muitas vezes não temos consciência, principalmente se a língua em questão é a materna.
Se aprender uma nova língua no conforto de nossa pátria pode nos deixar perdidos como cuzco em tiroteio, imaginem estar em outro país?
Durante dois semestre foi monitora de morfossintaxe. Em um desses semestres três gurias chineses integraram a turma. Elas normalmente não falavam nada nem perguntavam, mas quando faziam esperavam até que os outros (brasileiros) estivessem saindo. Elas se aproximavam devagar e perguntavam com calma e em voz baixa o que queriam saber.
Algumas das dúvidas eram mais do esperadas, outras não causaram supresa, uma tive dificuldade de encontrar a melhor forma de explicar e a última me fez rir. Não vou comentar as dúvidas que eram esperadas e nem as que não causaram surpresa (mas para saciar a curiosidade que possa surgir: tinha a ver com Machado de Assis).
Não lembro mais qual era o tópico teórico da aula, mas entre os períodos tinha um sobre mais uma CPI que provavelmente acabaria em pizza. Foi nessa expressão que as alunas chinesas se perderam. Como de costume, elas se levantaram e sorrindo perguntaram o que significava. Cortando caminho de forma não-satisfatória, respondi que significa que ia acabar em nada.
"Acabar em pizza" significa dar em nada, porque pizza é um prato que agrada aos gregos e aos troianos. Símbolo de confraternização capaz de unir os diferentes e discordantes. Elas não estavam, afinal, tão longe quanto pensavam do significado da expressão.
E por fim, às vésperas de um feriado nacional, elas se aproximaram (sempre sorrindo) e perguntaram se e por que tínhamos um feriado para tirar dentes. Mais uma vez, elas não estavam tão longe do significado. O que faltava era conhecimento histórico. Não tive como não achar graça e sorrir. Expliquei o porquê do nome Tiradentes e por que era feriado. Ao final não pude deixar de notar que elas se sentiram mais calmas, provavelmente pensando que, felizmente, o brasileiro não é primitivo a ponto de ter um feriado para tirar dentes.
A prova de ingresso ao mestrado da pucrs contemplou essa questão da língua como instrumento apenas ou como agente de processos. Sabemos que, desde a aquisição da linguagem, a língua interfere em termos psíco-fisiólogicos. Nossa memória, nossa forma de percepção do mundo (sonoridades, seleções e categorizações) são diretamente afetadas por uma língua. Lembremos a língua I (interna)e a língua E (as línguas existentes nas sociedades) de Chomsky..onde uma gera as possibilidades e a outra possibilita a as ocorrências..lembremos as descobertas em neurociências, em linguística cognitiva, em psicolinguística..
ResponderExcluirEu lembro dos sorrisos dos chineses e lembro que nunca consegui pronunciar o nome de uma das meninas..realemente não identificava e produzia o som adequado..talvez um dia, quem sabe..